quinta-feira, 8 de julho de 2010

Prólogo - a origem

O ano passado enquanto me encontrava em estado TTF (tou todo f#$&#o) prometi a mim mesmo que se pudesse voltar a pedalar iria fazer uma visita ao Santuário de Fátima. Confesso que não sou uma pessoa muito crente, mas que diabo (olha a blasfema) mal também não faria certamente. O Domingos prontificou-se logo a acompanhar-me, mas com uma condição, ir por terra e não por alcatrão.

O percurso

O trajecto foi feito recorrendo ao corte e costura. Uns meus, uns do gpsies e outros ainda desenhados no google earth. É claro que havia uma grande probabilidade da coisa não correr exactamente como planeado, e assim foi.

O parceiro

Fraquinho, como convém nestas coisas, que isto de fazer distâncias grandes é bem mais engraçado se nos formos divertindo com o sofrimento dos outros. O nome máquina de guerra é mesmo só para intimidar.

O despertar

Por norma acontece quando me levanto, mas desta vez aconteceu só lá para os lados da Cumeada. Já o do meu parceiro parece que foi acontecendo ao longo da noite. Ao que parece a tripa tirou-lhe o sono. É sempre espectacular de ver as desculpas que se arranjam para um antecipado paupérrimo desempenho.

O início

A subir, para não fugir muito à regra. E o aquecimento foi feito com o sol, que brilhava no céu por cima de nós… assim à macho.

O carro de apoio (ou também – carro de reanimação)

À pois é, a organização não deixa nada ao acaso, assim como assim tinha que precaver a eventual desistência do meu parceiro e fui logo tratando de lhe arranjar uma boleia. O staff era composto por pessoal altamente especializado… em coisas.





A jornada

Após a primeira subida do dia fui-me logo inteirando do estado do meu parceiro que denotava algumas dificuldades respiratórias. Afinal era do pó que estava a comer da minha roda (toma, embrulha).

Foi com a dificuldade esperada que se foi arrastando até ao primeiro PECOCA (ponto de encontro com o carro de apoio). Lá chegados tive que apertar a caixa de direcção, enquanto o D. engolia a primeira das 36 sandes do dia. Problemas de estômago? Pois, pudera.
Lá seguimos em direcção ao primeiro rebuçado do dia como o D. carinhosamente apelidava as subidas marcadas no Google earth que nem a pé quase se conseguiam fazer. Claro que logo a seguir nos esperava uma daquelas descidas que fazem a suspensão chegar ao fundo.





Pouco depois o segundo PECOCA e a segunda sandes do dia para o D. Pouco depois passaríamos o rio Zêzere em direcção a Ferreira do Zêzere. Logo após, voltámos a entrar na terra que nos levaria até Tomar.
Uns quilómetros à frente, o trilho que seguíamos começou e estreitar terminando num campo com vegetação seca e com ervas mais altas do que nós. Conferimos o gps, mas era mesmo por ali e assim teve que ser. Lá fomos abrindo caminho pelas ervas fora até chegarmos a uma clareira onde tivemos mesmo que parar para tirar todas as carrapetas que entretanto se haviam colado a nós. Mais à frente -isto no meio da floresta- um portão erguia-se à nossa frente como que a dizer que não podíamos seguir por ali. Uma vez que o mesmo se encontrava ali “sozinho”, isto é, sem vedação à volta, só tivemos que o contornar para seguir em frente. A saída daquele troço, teve que ser feita em jeito de escalada, uma vez que o portão seguinte encontrava-se devidamente acompanhado de uns muros que só poderiam ser transpostos passando por cima. Nada que nos fizesse alterar a nossa marcha. Entretanto fomos apanhando várias secções do trajecto fechadas onde tivemos que avançar a custo pelo meio do mato, o que nos custaria algumas lesões ao nível da cútis.





Antes de chegarmos a Tomar parámos para pedir água a um gentil -porém com uma ganda moca- jovem que se encontrava a regar a sua moto. A figura apresentava-se de olhos semi-cerrados com uma voz arrastada e uma tatuagem feita a caneta de feltro no braço esquerdo. A nossa masculinidade foi imediatamente posta em causa, perante a figura de, e este sim, o verdadeiro macho. Escusado será dizer que o diálogo entabulado com este jovem foi uma coisa desconexa e a roçar o destrambelho. –Então e Tomar ainda fica longe? –digo eu em jeito de despedida, -nããã, ficaaaa peeertooooo, maaaas aindaaaaa é um booooocadooooo longeeeeee – diz o jovem. Lá partimos de sorriso nos lábios e de gargalhada contida.
Pouco tempo depois, mas um bocadinho ainda (tal como nos havia sido indicado) lá chegámos a Tomar onde o carro de apoio nos esperava com o almoço e com uma botija de oxigénio para o D. Por pouco não teve que receber manobras de SBV quando parou.
Após enfardar umas 5 ou 9 sandes, meloa, morangos e uma garrafa de O2 o D. encontrava-se pronto para continuar o seu ritual de sofrimento e de auto-destruição que o acompanharia até Fátima ou até acabar por desfalecer no caminho.
A paragem seguinte foi no aqueduto de Pegões, um magestoso aqueduto onde aproveitámos para abastecer de líquidos e colocar qualquer coisa nos bolsos do jersey para o caminho.




O D. entretanto ia olhando com desconfiança para uns abutres que há já uns quilómetros nos seguiam lá no alto, sentindo talvez o eminente mas inevitável fenecimento do meu colega de jornada.



Até Fátima pouco mais aconteceu, a não ser mais um entusiasmante carreiro que entretanto se havia fechado com o tempo e que nos obrigou a voltar atrás e apanhar uma rota alternativa.
Acabámos por chegar a Fátima onde numa esplanada tratámos da re-hidratação e vimos a eliminação da selecção Francesa (este blog está à frente na categoria dos blogs quase actuais). Toma lá Domenech, embrulha que ninguém te manda ser parvo.

Para meu espanto e principalmente dele próprio, o D. acabou por chegar a Fátima (tenho para mim que em determinadas alturas do percurso ele foi deambulando em estado de semi-inconsciência misturada com embriaguês, não se lembrando de grande coisa).






Epílogo

Acabámos no Santuário onde agradecemos o facto de poder voltar a andar de bike (pelo menos por enquanto) e de o D. ainda se encontrar com vida depois deste dia.
Todos os acontecimentos relatados são inteiramente verdade e a nossa jornada acabou com 95 quilómetros a uma média de 18, o que foi bastante bom.

Talvez possa ter exagerado um pouco no que diz respeito ao meu parceiro, na verdade exagerei. . . bastante. O D. é uma máquina e de facto o nome “máquina de guerra” existe (autoria do Jerónimo) e muito bem, uma vez que seguir na roda dele não é fácil sendo muitas vezes quase impossível. Além do mais acumula com o facto de ser excelente pessoa dando-me o privilégio de ser meu amigo.

Obrigado Domingos pela companhia e pela partilha deste dia. Um obrigado também à Isabel (a sra. D.) a condutora do carro de apoio que acabou por chegar bem, apesar dos constantes desatinos com a Catarina (a menina que mora dentro do GPS).

As outras aventuras um pouco menos quase actuais irão sendo aqui colocadas à medida que for sendo possível. Também não quero de forma nenhuma passar para a categoria dos blogues actuais.